segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

Banho de chuva



Antes de sair de casa, bem que me avisaram pra não esquecer do meu xale de seda branca e azul. É, choveu, parou, choveu mais.


“A chuva nunca pára de cantar
A chuva nunca pára de descer”

Chuva é sinal de renovação, igual aos momentos da gente. A cada novo segundo transformações, mudanças inesperadas. E tudo é a tal da impermanência, é a conversa do rio “que é sempre sem antiguidade”. Igual às chuvas de verão. Chuva flutuante que passa rápido como um beija-flor.
Cessa a chuva e sai o sol novamente, como se nada tivesse acontecido, sem nenhum resquício dela. Só percebemos pelas poças d´água no chão e o colorido dos guarda-chuvas desconfiados.
Será que vem mais por aí? Ah, vem, sempre vem. Chuva, sol, tempestade, trovões e dias cinzas.


“E a chuva (chuva)
Com o seu sonho de água vem acesa
Pra lavar o que passou”


Há tempos não tomava um banho de chuva como o de ontem. Dos bons. Daqueles que sentimos certa raiva no início, pois estragam o penteado e molham nossa roupa novinha...Besteira, a roupa seca!
Aí eu percebo que nem adianta planejar ou criar tantas expectativas, embora enquanto me arrumava e escolhia o vestido mais bonito do armário, fingisse que estava tranqüila e desprendida das tantas expectativas.
Isso de ficar planejando muito as coisas é pura armadilha. Mais dia, menos dia, passa outra chuva e carrega o todo. E a chuva repentina leva o que passou. Se aceitarmos, leva só o que queremos deixar para trás. Mas ela deixa o que precisamos cultivar. É sempre assim. A chuva é uma espécie de ano-novo e nem temos que aguardar até o último dia de dezembro. Não, basta esperar que chova de novo. Chuva que me faz comemorar um novo ano em pleno fevereiro.


“E a chuva vem pequena e grandiosa
Acalenta ou revira o nosso lar”

Começo a escrever e saio para almoçar. Nisso, já havia chovido e parado muitas vezes em poucas horas. Volto e sorrio para aquele céu bonito, cor de sol, brilhando lá em cima. Acabo esse texto, olho para o alto e só vejo nuvens carregadas e cinzentas. Mais uma vez a impermanência. Ou a inconstância, como um bom amigo me disse.


“A chuva nunca pára de cantar
A chuva nunca pára de descer”

Desligo o computador e ouço “Preta”, do Cordel do Fogo Encantado. Num minuto descubro que a Chuva é a melhor amiga do Tempo.

3 comentários:

Anônimo disse...

a chuva leva da alma a poeira e o cansaço da vida cotidiana, mas em dias normais, que a chuva cria armadilhas no horário do almoço é bem difícil achar poesia e não ficar praguejando! ;)

Anônimo disse...

Quando o céu fica saturado do mundo, se fecha em convenção pra diluir com água nova a densidade dos dias. Um horário de almoço chuvoso pode irritar, mas é bem pouco pra lavar tanto os passantes desprevenidos. Nem quatro anos, onze meses e dois dias de chuva foram suficientes pra livrar de tanta solidão.

Nilma Raquel disse...

"A chuva é uma espécie de ano-novo" é o que de melhor ouvi nos últimos tempos. Não perca a capacidade de se renovar com a chuvarada, Ana querida. Um beijo!