segunda-feira, 15 de dezembro de 2008
Cor-de-rosa
No ano passado esqueceu a receita. Já tinha até picado as cebolas, comprado potes coloridos. Rasgou, sem ressentimentos, como quem observa placidamente um desabafo escrito num velho diário queimar na fogueira, o barquinho partir até Yemanjá carregado de pedidos, como quem guarda uma foto no álbum querendo que ela permaneça bonita para sempre. Começou o ano sem quantidades, tempo de preparo, sem se importar se havia passado do ponto, temperado demais.
Começou sem saber direito onde estava, mas com a certeza de que deveria estar era mesmo ali, mergulhando no mar daquela ilha infinita, pedalando uma velha bicicleta na areia ora lisa ora fofa, cuidando mais do que sendo cuidada. Voltou para São Paulo com bicho de pé por ter aposentado durante uma semana as sandálias, óbvio. Mas estava tudo muito certo.
Foi gostando demais daquela coisa de não ter receita. Então pode acrescentar isso aqui? Não precisa tirar do forno agora? O ano seguiu como começou: uma bagunça boa.
O quadro com Gene Kelly dançando na chuva foi pendurado, conforme prometido. Hoje, está ao lado de Carmen Miranda e Charlie Chaplin na parede cor-de-rosa do quarto.
Vestiu-se dezenas de vezes de Adélia Prado. Desdobrou-se em muitas; sabe que será mais outras tantas. E encontrou uma casa na floresta sacrílega de Roberto Piva tão quentinha que fez nascer em seu coração, quem diria, a vontade de seguir uma nova receita, com todas as dores e delícias.
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